Editorial: Jornalismo não é crime
Nesta sexta-feira (19), o Penarol Atlético Clube se manifestou publicamente e de maneira oficial contra uma jornalista. Não é examente uma surpresa que o trabalho da imprensa não seja respeitado. É uma espécie de cultura local, não só no esporte, tentar desmerecer e desaqualificar o trabalho da mídia.
O jornalista já está até acostumado com ligações de dirigentes que ameaçam de processo, exigem que determinados materiais sejam retirados do ar, pedem explicações sobre matérias publicadas e até dizem com todas as letras que a imprensa local tem que fazer estágio no Pará, porque lá, teoricamente, os jornalistas passam a mão na cabeça dos clubes quando eles erram, e por isso o futebol paraense tem resultados melhores. E tem uma quentinha, fruto dos tempos de pandemia, que é organizar coletivas para responder apenas aquilo que o clube quer, suprimindo perguntas que “não passam no crivo”.
Claro que tudo isso é absurdo, e vira piada entre os comunicadores. Nas rodinhas, quando vez ou outra, parávamos para tomar uma cerveja, essas histórias eram garantia de diversão, porque aprendemos a rir dessas fanfarronices. Até porque se fosse pra chorar, desidrataríamos. Só que o que aconteceu nesta sexta-feira extrapola o limite do folclórico.
Um clube não é obrigado a amar tudo o que sai sobre ele na imprensa, mas ele é obrigado sim a entender como funciona o trabalho de um jornalista. Até para entender sobre seus direitos. Mas a grande verdade é que a maioria dos clubes negligencia seu departamento de comunicação, que deveria ser o responsável por orientar a agremiação nessas questões. Os que têm, de fato, uma assessoria de imprensa, são pouquíssimos. O normal aqui no Amazonas é, ou a comunicação do clube simplesmente não existir, ou ficar a cargo de alguém que não é qualificado para esse trabalho. E quando profissionais qualificados são alocados, precisam gastar a boa reputação que construíram na carreira apagando incêndios desncessários provocados pelo próprio clube.
A jornalista Larissa Balieiro, da rádio Difusora, trouxe uma apuração comum. Ouviu fontes, que pediram pra ter a identidade preservada, e procurou o Penarol antes de publicar qualquer coisa. Para o clube, isso é “criminoso”, de acordo com uma nota de repúdio publicada em suas redes sociais, que menos de 24 horas antes, curiosamente, replicaram um conteúdo da mesma repórter, que repercutia a eliminação do Leão da Velha Serpa na Copa do Brasil, destacando a grande atuação do time, apesar do empate que abreviou a participação da equipe na competição.
Esse é o tipo de episódio que ilustra bem a relação dos dirigentes do Amazonas com a imprensa. Se falar bem, é amigo, se falar mal é inimigo, sendo que o único amigo do jornalista é o jornalismo. Ao menos os jornalistas sérios.
Só que esse caso em específico abre um precedente muito perigoso. Quando um clube não gosta de algo que sai na mídia e ataca um jornalista, ele joga a sua torcida, que muitas vezes coloca a emoção à frente da razão, contra uma pessoa que está apenas realizando o seu trabalho, diga-se de passagem, da forma como ele tem que ser realizado, seguindo os preceitos aprendidos na universidade.
O clube, através de suas contas oficiais em diferentes redes sociais, classificou o episódio como “lamentável” e “criminoso”, o que mostra um profundo desconhecimento da atividade jornalística. Ou é isso, ou é má fé mesmo. Estratégia para tirar o foco.
É sabido que a instituição Penarol não escreve notas de repúdio. Quem escreve são pessoas. Essas, no mínimo, não desconhecem apenas como é feito o trabalho jornalístico, mas também a própria grandeza do Penarol, tricampeão amazonense, que há mais de 70 anos é um ícone de resistência do futebol no interior do Amazonas e carrega a honra de representar a cidade de Itacoatiara. Se essas pessoas ao menos imaginassem o gigantismo do Leão da Velha Serpa, jamais permitiriam que a imagem do clube, neste momento, fosse associada ao amadorismo de atacar uma comunicadora pelo simples exercício de sua função.